sábado, 15 de novembro de 2014

Meu último Poema

Acabaram os meus poemas;
Este talvez seja o último.
Para um poema é necessária a inspiração.
Não quero mais me inspirar.
Não tenho mais em quem me inspirar.

Amores bem-resolvidos nunca me deram inspiração,
Eles já estão resolvidos e não há mais nada que se falar.
Amores não-correspondidos é que são a fonte,
E, para eles, os poemas ajudam a recolocar as ideias no lugar,
Os poemas nos servem de ensaio para o que queríamos dizer
E nunca poderemos fazê-lo.
Não tenho amores resolvidos.
Não tenho mais os não-correspondidos.
Nem quero tê-los.
Agora tenho não-amores
E estes são péssimos inspiradores de poemas.
Portanto este será o último – e o pior – dos meus.

E se, um dia, me vier um amor arrebatador,
Virá pra ficar enfim, e não precisarei mais deitar ao papel
Palavras bonitas ou feias.
E se, um outro dia, este amor arrebatador me ferir,
Joga-lo-ei fora antes que ele produza
Palavras de uma mente doentia.

Não haverá mais poemas, nem belos, nem sujos, nem bobos.
Não os quero mais, posso lidar sozinho comigo mesmo.
Posso me livrar das ideias sem ter que manchar páginas; não é justo com o papel
Ter que ficar com minhas mágoas e anseios e desejos e derrotas.
Não preciso mais de poemas,
Preciso viver.

Perdi uma inspiração que me acompanhou por décadas.
Não porque ela foi embora daqui,
Não porque ela fugiu da minha vida,
Não porque ela decidiu algo que não se decide sozinho;
Mas porque ela saiu de mim.
Foi embora de dentro de mim
E em seu lugar encostarei alguns móveis velhos, alguns quadros não-pintados,
E reaproveitarei os espaços que, após tantos anos, já nem lembrava que tinha.
Perdi a inspiração para sempre, e, mesmo que ela voltasse,
Não seria mais minha inspiração,
Não seria nunca mais algo que eu pudesse venerar.

Amores saudáveis não carecem de poesias.
Amores saudáveis carecem de vida, carecem de companhia, de proximidade,
Carecem de luz.
Era um poeta de olhos fechados,
Era um poeta platônico a olhar a parede e me deliciar com as sombras
Mas sombras não têm defeitos.
Abri os olhos.
E vi um mundo de cores e luzes e escuridão,
E vi a beleza da imperfeição de cada poro de um rosto entrando em anos
E pude sentir todas as angústias e desejos reprimidos, e medos,
Que se escondiam por trás destes poros, deste rosto.
E minha veneração pelas sombras, minha adoração pelo ideal
Esvaiu-se como um perfume que o ar não consegue reter.
Esta era minha inspiração: sofrer por amor, sofrer por não tê-lo; sofrer, enfim.
Mas já passou.
Não há amor que mereça meus sofrimentos, não há amor que mereça
Que eu entregue a minha vida por duas ou três palavrinhas
Rimando e pulando de uma linha a outra num papel pautado.

Acabou, este é meu último.
Um poema sem graça, sem rimas, sem métrica,
Feio de olhar e de ler, que nada diz a não ser a mim,
Inútil como os outros milhares que já compus.
Um fim melancólico para um poeta que nunca foi
Que nunca fui.
Que não mais serei.
E, apesar de ter total controle sobre as palavras que aqui vão,
‘Inda levarei a agonia de não conseguir impedir
Que meu último poema termine com a palavra amor...

15.11.2014

Nenhum comentário:

Postar um comentário