quarta-feira, 16 de abril de 2014

A fábula das cordas



- Responda, violino, onde vais tocar,
Assim, deste jeito, a nos deixar sem fala?
- Minha pobre viola, subirei no altar
E serei o centro, e serei o spalla!

- Mas, diga, violino: o que vais tocar
Para alegrar esta manhã triste?
- Meu súdito cello, tocarei eu Bach
E tocarei Mozart, e tocarei Liszt!

E serei xodó de Vivaldi, e tanto
Que ele, a mim, confiará sua primavera;
E despertarei, ao mundo, tal encanto,
Que haverão canções como nunca houvera.

Mas tu, minha irmã, se isto a consola,
Tu nunca serás, nesta vida, spalla;
Nem nunca terás, singela viola,
Nem frase e nem palco onde possas tocá-la.

Ao passo que tu, meu simplório cello,
Jamais saberás o que é estar à frente;
E nem o que é puro, e nem o que é belo,
E não sentirão tua falta, se ausente.

Mas, eu, terei sempre os portões abertos
E receberei de todos as palmas
E emprestarei meu nome a concertos
E tocarei solos, e tocarei almas.

- Pois quanta arrogância há no teu agudo!
Meus graves jamais gostariam de sê-lo;
Voz esganiçada! Antes fosses mudo!
Saibas tu que muito me orgulho em ser cello!

- Teu grande defeito – deves percebê-lo! –
É teu timbre tosco, que cansa e que amola:
Minha voz é um veludo, e, tal como o cello,
Também eu me orgulho em ser uma viola!

Agora vai, anda! Vai tocar teu Bach!
Estoure as suas cordas, meu caro menino!
Pois sem nossa ajuda, ninguém ouvirá
O som fraco e tosco d’um reles violino!

  

Tiago Bianchini - 2004

Nenhum comentário:

Postar um comentário